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Tratamento tem mais efeito com diagnóstico precoce

Não há expectativa de quando será possível detectar a atrofia muscular espinhal pelo Teste do Pezinho, no âmbito do SUS

Por João Cerino em 07/08/2023 às 10:32:28

Embora a atrofia muscular espinhal-AME esteja relacionada na quinta etapa de implantação do novo nĂșmero de doenças que podem ser detectadas pelo Teste do Pezinho, no âmbito do Sistema Único de SaĂșde, não hĂĄ expectativa de quando ela serĂĄ efetivada. A Lei 14.154, de 26 de maio de 2021, estabeleceu a ampliação de seis para cinquenta o nĂșmero das doenças que podem ser detectadas pelo Teste do Pezinho. A lei federal passou a vigorar em 27 de maio de 2022 e deu aos estados prazo de quatro anos para a incorporação das cinquenta doenças. A neurofisiologista e neurologista Marcela Câmara Machado, membro da Academia Brasileira de Neurologia-ABN, disse à AgĂȘncia Brasil que estĂĄ se tentando sensibilizar os estados para que se mobilizem e acelerem a implantação de diagnóstico das novas doenças, "mas ainda não hĂĄ previsão para que a AME seja incorporada de fato ao Teste do Pezinho".

No Ășltimo mĂȘs de julho, o Senado Federal instituiu o dia 8 de agosto como Dia Nacional da Pessoa com Atrofia Muscular Espinhal. "O objetivo desse teste é o diagnóstico precoce. Porque a gente jĂĄ sabe que todas as medicações por via terapia gĂȘnica, que é hoje a terapia mais cara do mundo, tĂȘm muito mais efeito se a criança é ainda sem sintomas. Ou seja, a gente diagnostica logo que ela nasce, antes de manifestar os sintomas, para ter uma vida, senão normal, muito próxima do normal", disse a especialista.

Estima-se que a incidĂȘncia seja de uma pessoa com AME para cada dez mil nascidos. No Brasil, são muitas crianças com essa doença considerada rara. Marcela informou que, na Bahia, são entre 7 e 8 crianças nascidas com a doença, por ano. No Brasil, o nĂșmero se aproxima de 50 a 60 novas crianças a cada ano. "É um nĂșmero alto para uma doença tão complexa". JĂĄ de acordo com a Associação Brasileira de Amiotrofia Espinhal-Abrame, o paĂ­s tem hoje cerca de trezentos novos casos de AME por ano.

INCURÁVEL

A AME não tem cura. "Os tratamentos são para otimizar e dão melhor resultado se os diagnósticos são feitos precocemente. Mas ainda não tem cura, apesar dessa terapia genética que se propõe a melhorar a função do indivĂ­duo, recompor a função que é perdida, do ponto de vista genético. A gente não sabe, inclusive, se essa terapia genética terĂĄ de ser repetida na pessoa na fase adulta, por exemplo. Não hĂĄ ainda estudos para isso", advertiu a neurologista. O que se sabe, atualmente, é que quanto mais precoce a criança é tratada, ela tem um desfecho melhor, destacou a médica.

De acordo com o Ministério da SaĂșde, a atrofia muscular espinhal é uma doença rara, degenerativa, passada de pais para filhos e que interfere na capacidade do corpo de produzir uma proteĂ­na essencial para a sobrevivĂȘncia dos neurônios motores, responsĂĄveis pelos gestos voluntĂĄrios vitais simples do corpo, como respirar, engolir e se mover. "Os indivĂ­duos nascem com uma alteração genética que perde os neurônios e nervos responsĂĄveis pelos movimentos, que estão na região da medula". A alteração genética faz com que não haja produção de uma substância que deixa esse neurônio saudĂĄvel.

Marcela Câmara Machado explicou que na fase um, a criança tem uma perda completa desses neurônios, tem uma fraqueza progressiva que leva a uma insuficiĂȘncia respiratória. "E essa criança, se não tratada, falece até um ano de vida. Ela precisa de ventilação. Se a gente der suporte ventilatório, ela fica dependente de ventilação da parte respiratória durante toda a vida. No estĂĄgio do tipo dois, a criança começa a ter sintomas entre seis meses e 18 meses. O tipo trĂȘs é acima de 18 meses". A criança começa uma fraqueza progressiva a partir dessa idade. O desfecho não é mais ventilatório. "No tipo dois, depois de seis meses, a criança não é capaz de andar; fica o tempo todo na cadeira de rodas. Na fase da adolescĂȘncia, ela tem necessidade de suporte ventilatório. É uma doença muito grave, com impactos social, emocional, psĂ­quico muito grandes nas famĂ­lias e no paciente também".

MEDICAÇÕES

No âmbito do SUS, hĂĄ um medicamento denominado Spinraza. Recentemente, foi incorporado outro remédio, chamado Risdiplam, mas os médicos estão aguardando sua publicação e atualização do protocolo. "Como é uma medicação oral, que depende de preparo de farmĂĄcia, os estados estão se organizado para ver a questão de logĂ­stica. EstĂĄ para ser publicado".

A terceira medicação é a terapia gĂȘnica, chamada Zolgensma. A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de SaĂșde-Conitec jĂĄ deu parecer favorĂĄvel, mas o medicamento não foi ainda incorporado pelo guia PCDT-Protocolos ClĂ­nicos e Diretrizes TerapĂȘuticas. Essa terapia foi liberada para crianças até seis meses de idade. "Mas se a gente não consegue diagnosticar precocemente, não vai conseguir tratĂĄ-las com essa terapia", ressaltou a médica.

COALIZÃO

A engenheira Adriane Loper, criadora do Instituto Fernando, em homenagem ao filho que morreu aos 9 anos de idade, em decorrĂȘncia da doença e uma das lĂ­deres do Universo Coletivo AME, informou à AgĂȘncia Brasil que agosto é o MĂȘs de Conscientização Mundial da AME. No dia 8 próximo, os membros do Universo Coletivo farão um acendeiro de velas e publicarão fotos nas suas redes sociais, "para manter viva a esperança de dias melhores". O evento é uma homenagem às crianças e jovens que morreram com atrofia espinhal. "Meu filho é um deles", destacou. As associações mundiais fazem o mesmo gesto. "Em função de tudo isso, agosto é um mĂȘs bem especial para nós".

As lideranças do movimento estão solicitando audiĂȘncia com a ministra da SaĂșde, NĂ­sia Trindade, para argumentar em prol da aceleração da incorporação da AME no Teste do Pezinho. Adriane afirmou que das 50 doenças listadas e que estão à frente da AME, tem muitas que não tĂȘm tratamento e a AME, segundo ela, não precisa de tecnologias que tenham que ser adquiridas. "É uma questão de reagentes, mas não de tecnologias", comentou.

Ela citou, ainda que, em congresso realizado este ano nos Estados Unidos, foram apresentados casos de crianças que, em função da triagem neonatal, feita nos Ășltimos anos, tomaram medicação com oito dias de vida "e estão andando, com todos os marcos motores normais". O filho de Adriane, Fernando, ficou nove anos em uma UTI. Ela defendeu que a AME seja incorporada logo no Teste do Pezinho, para que outras crianças, como seu filho, tenham direito à vida. Disse também que as crianças tratadas com diagnóstico precoce representarão uma "economia gigante" para o Poder PĂșblico. Nos Estados Unidos, conforme pesquisas apresentadas no congresso, os custos com tratamento precoce da AME se tornaram sete vezes menores.

O Universo Coletivo AME é a maior coalizão no Brasil pela causa da atrofia muscular espinhal que, se não diagnosticada nos primeiros dias de vida, compromete o funcionamento do sistema nervoso motor e dos mĂșsculos de forma acelerada. O Coletivo foi fundado em 2019 pela união de cinco instituições que atuam hĂĄ mais de 20 anos em diferentes regiões do paĂ­s e são lideradas por mães que vivenciam a AME no dia a dia: Associação de Doenças Neuromusculares-Donem, Instituto Viva Íris, Instituto Nacional da Atrofia Muscular Espinhal-Iname), Instituto Fernando e Associação Brasileira de Amiotrofia Espinhal-Abrame. O grupo atua no acolhimento, educação, conscientização e em ações voltadas para polĂ­ticas pĂșblicas e visa acelerar a cobertura da AME no Teste do Pezinho, para que o diagnóstico seja precoce e também, para garantir o acesso de todos os pacientes aos medicamentos disponĂ­veis no SUS.

Fonte: AgĂȘncia Brasil

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