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Modelo de rede digital afeta jovens

O uso excessivo ou inadequado de dispositivos digitais por crianças e adolescentes está ligado a diversos problemas

Por João Cerino em 13/10/2023 às 16:07:00

A área de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República abriu uma consulta pública para elaboração de um guia com orientações sobre uso de telas e aparelhos digitais. O uso excessivo ou inadequado de dispositivos digitais por crianças e adolescentes está ligado ao aumento dos índices de ansiedade e depressão, distúrbios de atenção, atraso no desenvolvimento cognitivo e da linguagem, miopia, sobrepeso, problemas de sono, riscos de abuso e vitimização sexual, ameaças à privacidade e de uso de dados pessoais, além de risco de vícios em jogos eletrônicos e uso de aplicativos.

A avaliação é do do secretário de Políticas Digitais, João Brant, que lançou o processo na terça-feira, 10, em Brasília. Segundo ele, o atual modelo de negócios das plataformas digitais é um fato de agravamento do problema. "Do nosso ponto de vista, os problemas, que se avolumam, na verdade decorrem de um modelo de negócios das plataformas, baseado na economia da atenção, em que os produtos são desenhados para maximizar engajamento e o tempo de uso desses dispositivos. Muitas vezes, esses objetivos de mercado estão dissociados de um objetivo de bem-estar das crianças e adolescentes e essa é a questão que a gente precisa tratar de forma equilibrada", afirmou durante o lançamento da iniciativa.

A consulta pública ficará disponível por 45 dias na plataforma Participa + Brasil. De acordo com o governo, a elaboração do guia se dará a partir das informações coletadas na consulta, com o auxílio de um grupo de trabalho de especialistas no assunto e deve durar cerca de um ano até ficar pronto. "A gente hoje está vendo, pelo uso não cuidado, não monitorado, não supervisionado, os efeitos colaterais adversos na saúde física e mental das crianças. E isso nos preocupa muito. O que a gente quer é uma mobilização da sociedade no sentido de conduzirmos o processo de cultura e uso das mídias digitais", destacou a secretária de Informação e Saúde Digital do Ministério da Saúde, Ana Estela Haddad.

Na consulta pública, o governo espera receber contribuições de especialistas de diversas áreas relacionadas com o tema, órgãos públicos, iniciativa privada e organizações da sociedade civil, além de pais, mães, familiares, responsáveis, profissionais da educação, saúde e assistência, além das próprias crianças e adolescentes. Empresas do setor de tecnologia também deverão ser ouvidas.

A iniciativa é conjunta da Secretaria de Políticas Digitais da Secom/PR e dos ministérios da Saúde, Educação, Justiça e Segurança Pública, Direitos Humanos e Cidadania e do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, em parceria com representantes da academia e de organizações da sociedade civil envolvidas com o tema.

EXCESSO

O Brasil é um dos países em que se passa o maior tempo utilizando smartphones, telas e dispositivos eletrônicos. Em média, são nove horas diárias de uso da Internet, segundo levantamento recente EletronicsHub. O brasileiro hoje se comunica, consome, informa-se e se relaciona com familiares, amigos e conhecidos, em grande medida, por meio de dispositivos digitais. De acordo com a pesquisa, o país só perde para as Filipinas em tempo de uso de tela. No caso de crianças e adolescentes, não é diferente. A última pesquisa TIC Kids Online, do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), mostra que em 2022, 92% da população com idade entre 9 e 17 anos eram usuários de Internet, sendo o celular o dispositivo mais usado por crianças e adolescentes.

O governo federal ressalta que, como as novas gerações são as primeiras a terem crescido integralmente num mundo digital, ainda não se sabe precisamente quais os efeitos de longo prazo de uma infância ou adolescência intensamente mediadas por plataformas digitais, games e aplicativos. Há diversas evidências, porém, de que o cenário seja preocupante.

A Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda que crianças menores de 2 anos de idade não devem ser expostas a telas, enquanto crianças entre 2 e 5 anos devem ter o tempo de tela limitado a, no máximo, uma hora por dia. Já crianças entre 6 e 10 anos devem utilizar telas por uma a duas horas diárias e crianças maiores e adolescentes, entre 11 e 18 anos, não devem ultrapassar o tempo limite de três horas de tela por dia, incluindo o uso de videogames.

Para Estela Aranha, assessora especial de direitos digitais do Ministério da Justiça e Segurança Pública, o público infanto-juvenil está especialmente exposto aos riscos sistêmicos das redes digitais, como a questão do modelo algorítmico e o design das plataformas, que estimulam comportamentos compulsivos que levam a fatores como depressão, ansiedade, compulsões de um modo geral, transtornos alimentares, compulsão ao suicídio e automutilação, coisas que estamos vendo frequentemente nas redes. "E aí, nosso objetivo é entender os fatores que levam a todos esses tipos de problema e tentar trabalhar para que o uso de telas, seja em ambiente privado e escolar, seja saudável", observou.

ORIENTAÇÃO

A intenção é que o material que será elaborado no formato de guia forneça recursos e aponte estratégias para promover o uso consciente de dispositivos digitais, como celulares, tablets e jogos eletrônicos, por crianças e adolescentes, e apresente formas de os pais e responsáveis supervisioná-los, ao mesmo tempo preservando sua autonomia de decisão. O ambiente escolar também é considerado um espaço estratégico de disseminação dessas orientações. "A gente precisa, nas escolas públicas, em especial, que os professoras se sita capazes de entender qual a melhor forma de uso de tecnologia", explicou Anita Estefani, diretora de apoio à gestão educacional do MEC.

Para Cláudio Augusto Vieira da Silva, que é secretário nacional dos direitos a crianças e dos adolescentes do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, "crianças e adolescentes são seres em desenvolvimento e, para eles e elas se desenvolverem, precisamos propiciar um ambiente sadio. A Internet, conforme se apresenta nos dias de hoje, para nós, pode servir para que crianças e adolescentes não tenham seu desenvolvimento sadio", pontuou.

Na mesma linha, o advogado Wadih Damous, titular da Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça e Segurança Pública, reafirmou que os direitos das crianças e adolescentes se sobrepõem a direitos comerciais das empresas. "Nós sabemos que o Código de Defesa do Consumidor é claro, peremptório, com nitidez cristalina, estabelece o direito da criança, não aceita que a criança seja tratada como consumidor. Essa exposição permanente de horas na Internet já se mostrou absolutamente nociva à sua saúde mental, à sociabilidade das crianças e adolescentes", argumentou.

Fonte: Agência Brasil

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